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Leitura 13/2021 – #lista1001✅
O Castelo [publicado postumamente em 1926]
Orig. Das Schloss
Franz Kafka (Rep. Tcheca, 1883-1924)
Cia das Letras, 2009, 368p.
Trad. Modesto Carone
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“Mas o que é o senhor, que nos solicita aqui com tanta humildade permissão para se casar? O senhor não é do castelo, o senhor não é da aldeia, o senhor não é nada. Infelizmente porém o senhor é alguma coisa, ou seja, um estranho, alguém que está sobrando e fica no meio do caminho, alguém que sempre causa aborrecimento” (Posição Kindle 978).
A narrativa de “O Castelo”, último livro escrito – e incompleto – pelo escritor tcheco Franz, se resume à chegada do agrimensor “K” a uma aldeia fictícia que envolve um castelo. Logo de cara, o leitor percebe que o estranho não é bem quisto, atitude que ganha ainda mais envergadura quando o agrimensor externa sua intenção de falar pessoalmente com o senhor do Castelo, Klamm.
É a partir daí que o absurdo toma conta da narrativa, que vai sendo desenvolvida com uma estranha mistura de suspense em crescendo, enigmas nunca desvendados e a hostilidade exacerbada pelos moradores locais que de tudo fazem para impedir que “K” acesse o Castelo. Eles não se cansam de lembrar-lhe que sua estada ali não é bem-vinda e que tal atitude inflexível é motivo para desconfortos vários tanto para as classes mais baixas quanto entre os altos funcionários do feudo.
Sim, Kafka consegue misturar a este caldeirão de perenes inquietudes uma estrutura burocrática sem igual, beirando à insanidade e o real, quando é quase possível acreditar que os personagens do romance estão, na verdade, encenando uma peça teatral repleta de matizes indigestos. É nesse sistema hermético que nosso protagonista tem de se imiscuir e onde busca meios de pedir a tal autorização para exercer sua profissão como agrimensor que, ainda seria dificultada pela neve que constantemente cai na aldeia. Mas “K” é intransigente, não percebe que o sistema está justamente ali para lhe dificultar os intentos; ele como um herói solitário que ousa enfrentar o sistema, encontra tantas adversidades, tantos obstáculos, sua teimosia o leva a viver vários dissabores, seja nas tavernas onde busca algum refúgio do frio insolente que castiga o povoado, seja no estranho amor de Frieda, uma ex-amante de Klamm, em quem “K” vê uma possibilidade de saber mais sobre o enigmático e recluso fidalgo.
Faz um bom par de anos desde que li “A metamorfose”, o estranhíssimo relato da transformação de Gregor Sansa numa barata gigante. Recordo que saí do romance confuso e assustado, tamanho o grau de impossibilidade criado pelo escritor. Não foi diferente agora, quando termino este romance nada convencional: mesmo durante os longos diálogos entre “K” e alguns interlocutores como Olga e Frieda, que confesso terem sido maçantes e cansativos, “O Castelo” é sim um livro interessante, que faz jus à série A da literatura contemporânea tamanha sua importância. É uma pena que o autor tenha morrido sem completar o livro, o que o torna ainda mais enigmático e, por isso mesmo, tão marcante.