Livro lido – Sudário, de John Banville

Leituras de 2022

Sudário [2002]

Orig. Shroud

John Banville (🇮🇪, 1945–)

Biblioteca Azul, 2015, 296p.

Trad. Cassio Arantes Leite

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“Raiva, raiva e medo, esses são os combustíveis que me movem, misturados em igual medida: raiva por não ser o que não sou, medo de descobrirem o que sou. Se um dia uma ou outra dessas forças se exaurir, o violento equilíbrio que me sustenta irá para o espaço e desmoronarei” (Posição Kindle 1058).

Se em “Eclipse”, John Banville, o autor do magistral “O mar”, compôs uma narrativa triste (sempre, aliás), meio fantasmagórica de um ator decadente que, ao não saber mais atuar nos palcos, vive se escondendo na vida real sob a capa do personagem mais apropriado para a ocasião, em “Sudário”, o volume dois dessa “trilogia Alex Cleave” vai narrar a vida de um homem que assumiu a identidade de outra pessoa por décadas.

Não sabemos exatamente quem está por trás de Axel Vander, o verdadeiro, morto há décadas, mas seguimos seus passos, sua trajetória como escritor, as muitas mulheres que seduziu e de quem acabou sendo odiado por muitas delas, um homem de certa forma arrogante, pedante, envolto e carcomido pelos fantasmas do seu passado inexplicado.

Ele está confortável no papel que soube desempenhar por anos, até que Cassandra Cleave (será a mesma que aparece em Eclipse?), pesquisadora literária, junta os pontos e descobre o segredo por anos ignorado. Cass acaba se envolvendo com o falso Vander, muitos anos mais velho que ela, com quem vive um romance complexo, onde ambos têm de lidar sobre os meandros da culpa, do engano e da falsa aparência.

Não por acaso o livro se chama Sudário, o incongruente e contestado manto que teria sido usado para cobrir o corpo morto de Jesus, para explorar a capa do Vander copiado. Ele vai revelando em camadas e cenas temporais circulares a multidão de equívocos, de escolhas erradas, quase sempre envoltas pelo desejo fescenino com o qual se nutre e, por fim, a descoberta do amor que sente por Cass. A derrocada trágica do volume é narrada com as últimas páginas, um verdadeiro exercício de boa literatura, que me agradou demais e que já me fez iniciar o terceiro volume, “Luz antiga”. Vejamos.


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