Título lido: Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo – Ensaios
Título original: Getting Away from Already Pretty Much Being Being Away from It All
Autor: David Foster Wallace (EUA)
Tradução: Daniel Galera e Daniel Pelizzari
Editora: Companhia das Letras
Anos de lançamento: 1993, 1996, 1999, 2004, 2005, 2006
Ano desta edição: 2012
Páginas: 312
Classificação: 3.5/5
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“O barato existencial, portanto, é conquistar alguma espécie de fuga do confinamento e dos estímulos — silêncios, paisagens rústicas que não se mexem, um voltar-se para dentro: ficar longe” (Posição no Kindle 799/15%).
Incauto como sou, faz um bom par de meses desde que me afoguei na prosa caudalosa de “Graça Infinita”, o vigoroso e sinestésico romance do escritor David Foster Wallace. Na ocasião, estava num tão grande êxtase em ler aquele gigantesco livro que sequer me preparei convenientemente para tamanha empreitada: vencer as quase 1.200 páginas em fonte pequena mais as inúmeras notas de rodapé que compõe o volume. Saí literalmente nocauteado na página 80 em busca de textos mais acessíveis para um leitor desastrado como eu sou…
Apesar de postergada a façanha de vencer Graça Infinita, ainda assim sempre quis ler algo do DFW (explicando, não é que Graça Infinita seja ruim, muito pelo contrário, a história, apesar de intrincada, é muito boa, todas aquelas termologias sensitivas e detalhadas em prol do combate à dispensável e insessante busca pelo entretenimento tem o seu valor, sem falar no frisson de poder sair ileso de tamanho calhamaço…).
Logo, busquei algo mais maleável dele, mais apropriado para leitores errantes como o eu, e acabei por topar com a coletânea de ensaios de DFW, o excelente “Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo”, livro que considero muito bom para iniciar-se na prosa do escritor.
O livro reúne seis ensaios de Foster, publicados entre 1993 e 2006 em revistas e jornais, e que são impressões bem interessantes do escritor sobre variados temas, onde pude perceber, buscam uma explicação pela gana ao exagerado anseio pelo entretenimento e a uma espécie de hedonismo. DFW, então exercendo a função de jornalista, descreve a própria experiência quando visitou uma feira agrícola no meio-oeste americano, dessas onde animais, máquinas agrícolas, exposições e simpósios são reunidos em vários dias de evento; em outro momento, num longo ensaio, faz um interessantíssimo relato de tudo que viu e viveu durante um cruzeiro de luxo pelo Caribe, onde o autor vai nos inserindo ao dia-a-dia da embarcação; já num terceiro texto, faz uma análise bem acurada sobre a polêmica envolta ao ato de escaldar lagostas para consumo, sobre como a ciência busca entender que o animal marítimo reage aos efeitos da água escaldante. Temas tão diversos, mas muito bem escritos!
Alguns desses ensaios, embora tragam muitas expressões e frases que me fizeram rir, compreendem, na verdade, temas complexos e sérios, disfarçados pelo mar de detalhismos que o escritor adota em seus textos. Para DFW, não há muito sentido em passar dias assistindo a mostras de animais, a embriagar-se com gordurosos sanduíches e se esgueirando por brinquedos de parques de diversões que causam verdadeiro pavor a Wallace, a participar nas reiteradas rodas de diversão num navio, na bestialidade que há no deleite de milhares de americanos que pagam caro para ter toalhas limpas a todo momento e comida desregrada. Sem falar em sua análise crítica no, ao seu ver, ato vil de jogar lagostas vivas num caldeirão de água fervente, Foster faz muito mais que trazer dados e estatísticas, quando traz à tona temáticas que, com o costume, deixaram de ser importantes.
Logo, em cada ensaio, é possível perceber as nuances do escritor, prematuramente morto aos 46 anos, mas que para quem os detalhes eram de extrema importância num mundo onde é tão comum perdermos a capacidade de se admirar com as coisas mais singelas. Vemos um DFW pitoresco, analítico, versado em tênis e Kafka, um ativista preocupado com a incolumidade das lagostas marinhas, fadadas a serem engolfadas por panelas com água quente. FLDFDJEMQLDT é daqueles livros incomuns na forma como foram escritos, mas que certamente conseguem levar o leitor às voltas com a singularidade dos pequenos prazeres. Vale!
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