Título: O conto da aia
Título original: The handmaid’s tale
Autora: Margaret Atwood (Canadá)
Tradução: Ana Deiró
Editora: @editorarocco
Ano de lançamento: 1985
Ano desta edição: 2017
Páginas: 368
Classificação: ⭐️⭐️⭐️⭐️
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tenho um grande apreço por distopias literárias. é sempre bom ler livros que falam de tempos futuros, sociedades obscuras e herméticas, mesmo que retratem tempos difíceis, o que não é incomum nesse gênero. como que os autores distópicos “brincam” de criadores, lançam em suas páginas, em saltos estelares, novas eras, novos costumes, expressões, valores e dogmas próprios, ou então utilizam de aguçada visão e anteveem dias futuramente turbulentos onde conceitos basilares como liberdade e autossuficiência deixam de existir sendo substituídos pela “caridosa” mão do estado.
cito sem pestanejar o “admirável mundo novo”, de huxley, o “fahrenheit 451”, de bradbury, o soberbo “1984”, de orwell e o menos badalado “o círculo” de dave eggers, todos já figurando entre meus distópicos lidos e relidos. a seu modo, estes são livros ousados, visionários, bem escritos (há quem odeie “o círculo”, embora eu tenha gostado dessa distopia tecnológica), e que trazem em suas páginas o colapso da sociedade como conhecemos e a tomada do poder por uma outra ordem mundial que impõe seu poderio anulando a individualidade e a privacidade.
não é diferente em “o conto da aia”. escrito pela canadense margaret atwood ainda em idos de 1984 (penso se ela teria se inspirado no livro de orwell, que fora publicado em 1949) durante uma temporada na alemanha dividida pelo muro (outra fácil alusão ao muro da fictícia gilead). atwood cria uma sociedade extremamente paternalista, onde mulheres são relegadas a classes inferiorizadas, tornando-se meros elementos coadjuvantes da reprodução humana. esposas, econoesposas, marthas, aias, mulheres da casa de jezebel, cada uma delas desempenha um papel nessa sociedade recém imposta com regras morais rígidas e maciço programa de vigilância. o livro em si é o relato de uma delas, “offred”, uma aia (espécie de barriga de aluguel de esposas inférteis) que vai descrevendo em primeira pessoa suas impressões da sociedade de gilead, entremeados com as suas lembranças do mundo como era antes. ficamos sabedores do dia a dia, do medo latente das severas punições para os opositores do regime, da busca por suas raízes (marido e filha), do drama que vive na cada vez mais difícil expectativa de engravidar para continuar apadrinhada pela casa do comandante fred (conceitua a perda do controle de seu próprio corpo). offred vive engasgada com tanta opressão, não pode falar, confiar em quem quer que seja, até que um dia ela descobre que há uma alternativa: uma secreta horda de subversão subsiste em gilead e ela enfim pode ter alguma esperança de recuperar seu passado…(mais não conto, porque seria um spoiler dos diabos).
gostei muito desse livro. faz-nos pensar bastante na dicotomia existente entre o sagrado e o profano, na discrepante atitude dos comandantes, em tese os mantenedores do regime e que não se abstém dos prazeres carnais da casa de jezebel, na própria concepção da mulher como parte indissociável da vida. e principalmente em como o anseio pelo que o futuro resguarda, as incertezas de dias vindouros, dias obscuros, o medo gerado pelos horrores da maldade humana podem ou não relegar-nos ou às próximas gerações. distopia faz isso na gente: olhar bem à frente, mesmo que seja de forma surreal.
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