Título: História do novo sobrenome
Título original: Storia del nuovo cognome
Autor: Elena Ferrante (Itália)
Ano de publicação: 2016
Tradução: Maurício Santana Dias
Editora: Biblioteca Azul (@globolivros)
Páginas: 472
Minha classificação: ⭐️⭐️⭐️
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Uma das coisas boas de se ler bons livros é a tentativa de buscar compreender as intenções do(a) autor(a) na construção de seus personagens. Uns são fáceis, já outros nem tanto.
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Foi com essa intenção que adentrei em História do novo sobrenome, ainda absorto de A amiga genial, primeiro livro da série napolitana. Ali você logo encontra a familiar caudalosa enchente de palavras e emoções da Ferrante recomeçando do término do volume anterior, que terminou de forma abrupta, deixando o leitor num suspense danado.
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Como o próprio título diz o romance trata da continuação das reminiscências de Lenu em reconstruir a história que gira — sempre — em torno de Lila. Aqui é retomado o relato interrompido no casamento da Cerullo — agora Carracci — e os primeiros anos da vida de casada da amiga com Stefano. A fórmula apresentada no tomo 1 é continuada, os acontecimentos no bairro onde as amigas viveram vão se desenvolvendo, novas intrigas e romances vão sendo concretizadas na trupe de Lila e Lenu. A novidade está naquelas partes onde à ausência de Lenu, os acontecimentos são extraídos dos cadernos secretos de Lila, que acabam nas mãos da amiga.
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Como pano de fundo, Ferrante ambienta o romance nos anos pós-guerra, nos conflitos dentro da própria Itália e claro, com eles a clara luta da mulher num ambiente tipicamente machista. Nesse ambiente ainda tão engessado, as antes meninas começam a descobrir as mudanças no corpo (sexualidade) e nas emoções. Os filhos são logo gerados, as famílias simbiotizadas, as guerrilhas no bairro adelgaçadas.
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Mas é quando também a Ferrante, autora dos diabos!, vai dando mais complexidade à personalidade nada fácil de Lila: o furacão que é Rafaella mostrada duma forma que, pelo menos eu, não soube destrinchar e não tive como findar o romance sem ao menos odiá-la minimamente. As decisões irresponsáveis, os atos inconsequentes, na maioria das vezes fruto da mera vontade, são a aparente mola mestra que rege Lila e de certa forma cria uma antipatia no leitor. Na sua sombra, sempre a indecisa, a dúbia, a inepta Lenu, com suas frequentes crises de identidade, sua auto-negação em favor da amiga, seu inferno pessoal trazido por essa dependência doentia. Essa falha de caráter de Lenu, sua fraqueza interior fica mais evidente quando ela decide acobertar o romance proibido de Lila e Nino (sempre o seu amor inalcançável). Foi uma das passagens mais fortes do livro e que mais gerou mal-estar em mim. Não quero ser preconceituoso nem muito menos ditar regras, mas a cumplicidade de Lenu em mentir para Nella e para a mãe de Stefano para encobrir os planos fesceninos de Lila geraram sentimentos diversos em mim. Tive de engolir a duras penas sua sádica entrega a uma amizade que nela só veio causando sentimentos ruins. Ali, diante das próprias reflexões, Lenu me decepcionou muito, isso porque sua força interior não foi capaz de negar a ajuda a mais um dos inúmeros atos irresponsáveis de Lila. São cenas fortes, e é nesse ponto que minha intenção de entender o que move as duas ganha mais um invólucro insondável…
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Mas quando eu já tinha perdido a fé em Lenu, mesmo o leitor sabendo do potencial que essa menina tem, e isso apesar do receio que ela tem de mostrar suas qualidades intelectuais e acadêmicas algo inesperado (e bom dessa vez!) acontece em sua vida, mas claro, no final do livro onde mais uma vez Ferrante nos deixa envoltos em mais um suspense, que só a leitura do próximo volume da tetralogia elucidará.
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