Título: Os fatos – a autobiografia de um romancista
Título original: The Facts – A novelist’s autobiography
Autor: Philip Roth (EUA)
Ano de publicação: 1988
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 208
Minha classificação: ⭐️⭐️⭐️
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A fórmula sempre dá certo: qualquer bom leitor que possua sua lista de escritores prediletos vai querer se deleitar sobre sua vida, os detalhes e nuances por trás da forma como os livros foram concebidos.
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Philip Roth compõe minha [curta] lista de escritores essenciais. Assim como fiz com Machado de Assis — outro escritor essencial– de quem li todos os romances e mais uma porção de contos e crônicas, pretendo ler todos os seus romances também. Com a diferença que não na ordem em que foram publicados, como fiz com os romances machadianos.
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Enquanto em Machado eu me deleite com o melhor do Realismo tupiniquim, com seus laivos irônicos e dissecadores da alma humana, em Roth encontro uma prosa de uma elegância sem igual, cujos temas espinhosos e nada agradáveis como a morte, a questão judaica e o próprio sentido da existência são desfiados em livros maravilhosos como Homem comum e Patrimônio.
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Neste Os fatos nos é apresentado um pedaço generoso da vida pessoal do autor de O complexo de Portnoy. Abarca desde a juventude no bairro de Weequahic, em Newark até mostrar um Roth já consagrado, mas saído de um casamento devastador que muito mais que dinheiro, tornou infernal a sua existência. É um livro revelador sob vários aspectos. Não traz exatamente aquilo que todo leitor quer encontrar numa biografia de um autor amado, como as leituras que fez, de onde foram extraídas as ideias que conceberam livros ou mesmo detalhes banais, que em algum grau traz deleite ao fã-leitor. Contudo, você encontra facilmente em Os fatos detalhes que compõem boa parte da matéria tratada em seus livros, principalmente no que se refere à sua essência judaica. Roth aparentemente busca ter uma vida o mais americanizada possível. Em nenhum momento de sua narrativa você o vê preocupado com tradição, hábitos e exigências com objetos ligados ao judaísmo. Talvez por isso possa, com toda propriedade, estar sempre pondo em xeque seus personagens judeus, com suas incongruências e ditames.
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Desse livro gostei muito de saber como o autor se depara muitas vezes com suas criaturas. Ou mesmo percebe que não é possível dissociar um do outro. Muitas vezes Roth percebe essa dualidade, ou mesmo sua incapacidade de criar personagens com nuances tão complexas. Notável a passagem em que ele analisa o “golpe” que sua ex-esposa lhe deu ao comprar uma amostra de urina de uma negra que estava grávida e fê-lo crer que iria ser pai….
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Aliás, é na vida emotiva que o livro mais se detém, principalmente no casamento falido que teve com Maggie Williams, uma mulher desestruturada e incontrolável que além de enganar Roth com uma falsa gravidez, é a sua maior e mais terrível algoz por anos, até morrer num acidente de carro. Sim, escritores tem vidas aparentemente normais.
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Roth jamais decepciona: mesmo falando de si mesmo através da boca de um de seus mais primorosos personagens, Nathan Zuckerman, ele vai revelando uma faceta que a meu ver, em nada o diminui.
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