DETALHES SÃO TRAÇOS QUE se constroem a dois. São pequenos símbolos que falam muito mais do que uma vida inteira de palavras. Verdadeiras e ínfimas partículas do estar junto.
Uma casa jamais estará vazia, isenta de vida, enquanto houver detalhes de uma vida juntos. Seja em cada canto, em porta-retratos, nas roupas largadas na cabeceira da cama, na forma como foi espremido o tubo da pasta de dentes, na mistura cultural dos livros que agora formam uma única biblioteca, tudo denuncia a exatidão comum de duas vidas.
O amor nada mais é que a soma dos detalhes: na verdade o amor se rende a esses pequenos personagens, todos os dias sendo fiados com linha humana, todos os dias sendo pintados com a púrpura dos corações que se amam. Amar, por isso mesmo, não deixa de ser um desafio doloroso! É, antes de tudo, a reunião dos traços trazidos quando se era um apenas, construídos livremente à luz da solidão alheia e intrépida, e que, em dado momento, chocam-se, estranham-se, estremecem sob o pavor do ato de desvendar-se, de mostrar-se assim como se é.
Também é ato de coragem: já que ninguém suporta o fato de que há detalhes que preferimos que sejam ocultados para sempre. Mas, juntos, isso é tarefa inexequível, já que à porta jazem os detalhes trazidos pelo outro, prontos para um embate ideológico-sinestésico. Um encontro de águas turvas, desiguais, que se insinuam, se tocam, se manifestam, se…envolvem.
Não há mais, quando juntos, forma de livre expressão dos detalhes. Tudo se forma a partir dos dois que um se fizeram. Sonhos começam a ser compartimentados num só sentir; lembranças são detalhes particulares fiados à luz dos detalhes do outro, que as absorve e as retém, trazendo à baila os seus detalhes, com a mesma carga de emoção.
Vida é a arte de marcar o viver dia após dia. Há pessoas que desistiram de si próprias. Antes mesmo do suicídio físico, já dantes suicidaram a marca da sua existência, negando os próprios detalhes de sua vida. Preferiram ocultar-se sob o nada auspicioso caminho da escuridão. Nada podem sentir, pois apagaram suas “pegadas”, os detalhes que constróem nossos corpos, mentes e lembranças.
Sim, viver é a vida marcada por um pouco de nós. Juntos somos mais que necessários. Sozinhos, somos tão frágeis quanto a pluma, que vaga sem saber para aonde vai.
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AMEI SEU TEXTO…Parabéns!
gracias, Nair.