O CAMINHO PARA A escola era o início de sua felicidade particular.
Os quarteirões iam sendo percorridos por passos ansiosos e cheios da habitual satisfação que o invadia todas as manhãs. Nem os pesados livros, acomodados na mochila jeans puída, eram incômodo diante do que logo, logo viveria. Naqueles dias, a escola era o único mundo que lhe trazia a indizível sensação de pertencimento.
Os corredores apinhados de alunos tinham uma poesia particular, oculta e, ao mesmo tempo, tão evidente. De um canto, simplesmente contemplava o vai-e-vem de garotos, de todos os tamanhos e cores, vivendo aqueles instantes que um dia seriam pedaços do pretérito, escrito aos poucos. A fila da merenda amontoava-se cada vez mais, num empurra-empurra desorganizado e barulhento. Já num outro ponto do grande pátio, os garotos mais atrevidos proferiam, às meninas, frases melosas no intuito da conquista amorosa.
Em algum outro ponto estaria alguém observando-o também? Aquele pensamento trouxe-lhe certa inquietação.
Sua contemplação daquele instante o fez ficar nostálgico. De novo o desejo de pertencer, assim como cada menino que fazia parte do seu grupo, assim como os guris mais velhos que, de uma hora para outra, encontravam pela primeira vez o amor …
O sino apitava, avisando o início das aulas.
Devagar, caminhou para sua sala onde no alto do batente havia a plaqueta de fundo branco com os dizeres em azul: 5ª Série “B”. Acomodando-se na sua carteira, encontrou o bilhete. A princípio achou que aquilo era brincadeira dos seus colegas. Olhou para cada um, tentando encontrar alguma evidência da autoria daquela facécia sem graça. Em vão. Disfarçadamente, introduziu o misterioso pedaço de papel dobrado entre as páginas do livro de Geografia e leu seu conteúdo.
E logo o cheiro das folhas de papel, o pó do giz que se acumulava no chão próximo ao quadro negro, o barulho das carteiras sendo arrastadas, a confusão de vozes, as paredes apinhadas de trabalhos escolares, a vastidão de camisas de tergal branco com logotipo da escola no bolso, tudo isso perdeu a importância.
De repente, sentiu que alguém o observava. O seu desejo de pertencimento fora concedido.
Crédito da imagem: deviantart.com By PS I still love you by orangefruits